Total de visualizações de página

sexta-feira, março 27, 2009

O SENTIDO DA VIDA

Assim que amanheceu, Raul procurava um sentido para a sua vida, tinha passado por maus bocados como todas as outras pessoas, mas sempre as ouvia dizendo isto me dá prazer fazer ou aquilo me dá mais prazer de fazer, ou seja, cada um tinha, o que podemos chamar de dom, mas Raul nunca pode responder a esta pergunta "O que te dá mais prazer?" Por conta desta dúvida tinha rodado muitas paragens, quando jovem fugiu de casa várias vezes e sempre recapturado, por assim dizer, nunca soube responder a seu pai por que o fazia, na verdade, como hoje, Raul só procurava um sentido para a sua vida, parecia que a havia desperdiçado, já contava com seus quarenta anos, nunca estudou muito tinha terminado o segundo grau na base da paulada, e jamais conseguiu um bom emprego, teve muitas mulheres, mas nunca se amarrou a nenhuma, filhos, ainda não havia tido notícias se os tinha. Enfim, era um homem perdido. Ainda sem entender o seu papel na sociedade foi abordado por um transeunte:

- Você sabe me dizer onde fica o hospital das clínicas?

- Claro, meu senhor, é ali você dobra aquela esquina e vai sair em frente ao hospital.

- Obrigado senhor.

- De nada.

Raul passou o dia todo pensativo, teria que resolver este problema que parecia mais misterioso que o mistério da Santíssima Trindade. Afinal para que eu sirvo? Achou que um psicólogo poderia ajudá-lo. Passado alguns dias:

- Doutor, o senhor é a minha última esperança.

- Não sabe quantas vezes já ouvi esta frase.

- Acredito. Apesar dos meus 40 anos, doutor, ainda não sei para que eu sirvo.

- Sei e já tentou fazer de tudo para encontrar este fantasma não é verdade?

- Fantasma?

- Sim, as pessoas parecem que precisam de um motivo para descarregar suas frustrações, a mais nova moda é achar que são culpados de alguma coisa, invariavelmente a de não servir para nada. Citando um ditado de internet "Se você não servir para nada, ao menos serve de mau exemplo".

- Pensei que o senhor iria me animar.

- Não é esta a minha função, a minha função é fazer você enxergar um caminho que está obscuro ou invisível para você.

- Certo e o que o senhor acha que devo fazer?

- A resposta está dentro de você, eu sei o que é melhor para mim, para você eu posso dar conselhos, mas eles dificilmente teriam crédito, já que são baseados na minha experiência de vida ou na de outros pacientes, não tenho certeza que serviriam para você.

- E então.

- Então a partir de hoje você vai fazer um exercício mental, ou seja, dizer para você mesmo em pensamento que você tem as respostas para as suas dúvidas.

- Acha que vai funcionar?

- Você irá me dizer, somos mais inteligentes do que imaginamos, senão ainda estaríamos na idade da pedra, se você pensar na evolução, isto te inspirará a evoluir a si próprio.

- Belas palavras doutor, mas na prática ainda vou estar sozinho.

- A solidão é uma escolha, você não precisa fazer isto sozinho, pode pedir ajuda dos amigos familiares ou quem quer que esteja ao seu redor.

- Tudo bem vou experimentar o exercício.

Raul saiu do consultório aliviado. Pensando que talvez não fosse tão inútil assim; lembrou de muitas coisas que fez em prol de outras pessoas. Teve aquela vez, em que deu o último litro de leite que havia no mercado para uma mulher cuja criança chorava de fome. Teve ainda aquela outra vez em que dividiu o guarda chuva com um senhor na rua e o levou até o seu escritório. Teve ainda aquela outra vez em que pagou a passagem de ônibus a uma senhora que tinha uma cédula acima do troco máximo do cobrador. Como sempre andou distraído na sua vida, Raul foi atropelado ao sair do consultório. Foi para o hospital em estado grave ficou na UTI por quinze dias. Logo depois foi para o quarto e conheceu outros enfermos sem esperança. Ajudou-os na medida do possível e nem acreditou quando o médico disse que ele estava de alta. Ele já havia se acostumado com pessoal do hospital e as enfermeiras já não se lembravam mais como era o hospital sem o Raul. Ele havia se tornado imprescindível, pois tinha muita paciência com todos os doentes e um bom humor contagiante, na verdade nunca esteve tão feliz. Então depois de sua alta, foi cursar enfermagem e voltou todos os dias ao hospital até que se tornou parte do quadro de enfermagem. Raul nunca mais voltou ao consultório de psicologia porque finalmente encontrou um sentido para a sua vida.

sexta-feira, março 20, 2009

O sortudo

Gotlieb era um homem diferente, tinha uma ex-esposa, uma atual, uma amante e cinco filhas. Então porque ele era diferente de quem quer que seja? A diferença é que todas dependiam financeiramente dele e ele não tinha um emprego de ganhar rios de dinheiro, ele era gari. Ganhava muito pouco. Mas qual era a mágica? Como ele conseguia transformar um salário mínimo em sustento para todas as suas mulheres? Ora, ele tinha muita sorte, todo mês ele ganhava dinheiro com algo diferente, num mês, ganhava no bilhar, no outro no pôquer, em outro nas loterias da caixa e por aí vai, mas como as suas mulheres exigiam muito dele, nunca tinha um centavo sequer no bolso. Quem o conhecia não conseguia entender como ele conseguia manter esta situação, principalmente com a ex-esposa, que tinha 3 filhas e ainda morava com um cara que segundo as más línguas também era sustentado por Gotlieb. Quando perguntavam, ele dizia que fazia muita hora extra e assim ficava fácil cuidar de tudo, mas um dia a sorte mudou, Gotlieb foi demitido do seu emprego de gari e inexplicavelmente perdeu o seu dom de vencer jogos, começou a perdeu grandes somas e num ato desesperado perdeu até uma de suas filhas num jogo de pôquer, um jornalista atento publicou num jornal de grande circulação as letras garrafais: "PAI DE FAMÍLIA, PERDE FILHA NA MESA DE PÔQUER" e a foto do desconsolado pai na primeira página do jornal, assim todos descobriram como ele cuidava de todas ao mesmo tempo, aliás, as mulheres ficaram sabendo umas das outras e Gotlieb só não foi linchado por elas por intervenção dos vizinhos. Como desgraça pouca é bobagem, neste mesmo momento de dificuldade Gotlieb soube da morte de sua mãe que morreu do coração pelo susto que tomou ao ver a foto do filho estampada no jornal dando conta de perda de sua filha na mesa de pôquer. Sem dinheiro sem mulheres e sem mãe, quase não acreditou quando bateu a sua porta alguém que lhe traria uma notícia boa:
- Será, que é mais uma notícia ruim? - Pensou consigo mesmo.
- O Senhor é o Gotlieb Ahmed Soares.
- Sim.
- O meu nome Guaraci Aleluia.
- Como vai senhor Aleluia?
- Muito bem, estou aqui senhor Gotlieb para lhe oferecer uma proposta para a produção de um longa metragem.
- Longa metragem, o senhor me explicar do que se trata?
- Ah sim, quero produzir um filme sobre a sua história, o que o senhor acha?
- Já era hora de uma boa notícia, mas isto poderia resolver um problema e criar outro.
- Do que está falando?
- Não se preocupe é coisa minha, mas me fale mais deste longa metragem, e assim mesmo que se diz né?
Explicações dadas:
- Mas quando eu vou receber o dinheiro?
- A princípio vamos lhe pagar 200 mil reais e mais uma porcentagem da bilheteria, isto deve cobrir os direitos da sua biografia e também os da exploração da sua imagem.
- É claro, obrigado por ter vindo senhor Aleluia, apareça mais vezes, principalmente se tiver boas notícias assim.
Por óbvio que as mulheres voltaram as boas com Gotlieb, afinal onde há dinheiro, há alguém querendo vender seus sentimentos comprados na feira. Mesmo sabendo que os motivos eram estes, Gotlieb estava feliz por manter a sua mágica sorte trabalhando a seu favor.